Leitura: Mateus 16:13-20; 18:15-20
Texto: Dia do Senhor 31

Irmãos e irmãs em nosso Senhor Jesus Cristo,

Na Confissão Belga, confessamos que a verdadeira igreja pode ser reconhecida por três marcas: a pregação pura do Evangelho, a administração pura dos sacramentos e o exercício da disciplina eclesiástica.

A disciplina eclesiástica é provavelmente a responsabilidade mais negligenciada da igreja no cristianismo moderno. Isso é verdade nas igrejas protestantes, é verdade nas igrejas evangélicas e é certamente verdade (muito mais ainda) nas igrejas católicas romanas — onde você pode acreditar em praticamente qualquer coisa e viver quase como quiser, e ainda assim ser recebido na comunhão se for para a missa pelo menos uma vez por ano.

Mas o que vemos em nossa leitura de Mateus 16 e 18 é que a disciplina eclesiástica é uma responsabilidade dada à igreja, e deixar de cumpri-la equivale a desobediência. Na verdade, uma igreja que se recusa a exercer disciplina não pode nem mesmo ser chamada de “igreja”. Vamos dar uma olhada nas duas passagens que lemos. Já examinamos Mateus 16 várias vezes quando consideramos os nomes e a identidade de Cristo. Lá, examinamos as palavras de Pedro a respeito de Cristo. Agora, queremos considerar as palavras de Cristo a Pedro. Pedro confessou, corretamente: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. E o Senhor Jesus respondeu:

“Sim, e eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”.

Há algumas perguntas que queremos fazer sobre isso:

Primeiro, o que é esse “reino dos céus”. O que Cristo quer dizer com isso? Cristo falou muito sobre o Reino dos céus. Na verdade, esse é o grande tema de todo o ministério de Cristo. Mateus 4 nos diz, a partir do momento do batismo de Jesus, Mateus 4:17:

“A partir daquele momento, Jesus começou a pregar, dizendo: ‘Arrependam-se, pois o reino dos céus está próximo’”.

O que é esse reino dos céus?

O “reino dos céus” se refere à nova ordem mundial que Cristo veio construir. Embora seja chamado de reino dos céus, isso não significa que seja uma realidade que apenas existe nos céus, ou que fosse apenas futura. Pois o Reino dos Céus (ou o Reino de Deus) se refere ao domínio de Cristo sobre corações, vidas, famílias, e povos inteiros onde for que as pessoas sejam levadas a Ele em obediência. Este reino existe em parte agora, na era presente que é a era da igreja, e a expectativa que as Escrituras nos ensinam a ter é que ela continuará a crescer e alcançar as nações e levá-las a obediência a Cristo até o dia em que Cristo voltar. Portanto, em certo sentido, vivemos agora no Reino dos Céus, porque Cristo está reinando e nós fazemos parte da igreja e nossas vidas e lares são governados por Cristo. Somos cidadãos do Reino e participamos dele. Mas esse reino ainda não está completo: ele será perfeito quando Cristo voltar e julgar o mundo, e então começar a governar em Seu Reino perfeito. É isso que Cristo quer dizer aqui com “Reino dos Céus”. Este reino inclui a igreja agora, mas não chegou a sua plenitude ainda.

Então existe este reino, de qual nós temos o privilégio de fazer parte. E existem também os cidadãos deste reino. E assim Cristo fala sobre diz que os discípulos receberiam as “chaves” desse reino: ou seja, a autoridade para admitir ou excluir pessoas do Reino de Deus.

De certa forma, você pode pensar nas “chaves” do reino dos céus como passaportes ou papeis de cidadania, que declaram que você é um cidadão.

Aqui está o ponto, então: Deus não deixa a nosso critério decidir se somos ou não cidadãos do Seu reino. Ninguém pode se declarar cidadão. Em vez disso, Cristo deu à igreja a responsabilidade de tomar essa decisão.

Agora, a igreja não emite passaportes. Mas a igreja recebe membros pelo batismo e pela profissão de fé, e na hora de sair de uma igreja para outra, a igreja, pelos oficiais ordenados, envia uma carta atestando à doutrina e vida da pessoa, para que seja recebida como membro em uma outra igreja fiel. E também, quando necessário, a igreja também exclui de sua membresia—e assim, também do reino de Deus!—aqueles que vivem contrários aos mandamentos de Deus.

Então veja, a igreja tem uma responsabilidade para proferir julgamentos—de acordo com a Palavra de Deus. E estes julgamentos tem grande consequência. Ninguém se faz um membro da igreja sem autorização, e a excomunhão da igreja significa que a pessoa não é somente cortada de membresia daquela igreja, mas que ela é excluída por Cristo do Reino de Deus. Foi isso que o Senhor Jesus disse a Pedro: “tudo o que você ligar

[ou vincular
ou
trancar]

na terra será ligado no céu, e tudo o que você desligar na terra será desligado no céu”.

Em Mateus 18, o Senhor ensinou aos seus discípulos como o julgamento deve ser feito dentro da igreja:

Matt. 18:15–18: “Se teu irmão pecar [contra ti], vai argui-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. Se, porém, não te ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que, pelo depoimento de duas ou três testemunhas, toda palavra se estabeleça. E, se ele não os atender, dize-o à igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e publicano. Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na terra terá sido desligado nos céus.”

Lá vemos a mesma expressão. Fica claro que as “chaves do reino” referem-se ao direito de julgar em nome de Cristo para admitir ou excluir pessoas do Reino de Deus. Para conceder ou retirar a sua cidadania, e consequentemente a sua salvação.

Isso tem que levado a muito sério: Cristo promete honrar os julgamentos da igreja quando for feita de acordo com Sua Palavra. Aqueles que são excomungados pela igreja, são excomungados por Cristo. Cristo promete isso: eles estão destinados ao inferno.

Isso leva à pergunta: quem tem essa autoridade hoje?

A Igreja Católica Romana afirma que essa autoridade foi dada exclusivamente a Pedro (não a todos os discípulos) e que, como (segundo eles) Pedro acabou se tornando o bispo de Roma, agora o Bispo da Igreja Romana continua exercendo essa autoridade exclusivamente

.

Veja que tem vários passos especulativos e de fato errados nesta afirmação. Por um lado, essa autoridade para julgar não foi dada somente a Pedro, mas a todos os discípulos. Talvez se você ler apenas Mateus 16, você poderia sair concluindo que foi dada apenas a Pedro, já que Jesus estava falando com Pedro. Mas em Mateus 18 fica claro que Jesus estava falando para todos os discípulos.

E mesmo que Jesus a tivesse dado exclusivamente a Pedro, isso nunca significaria que ela passaria para a igreja de Roma ou para o Bispo de Roma. Na verdade, nem temos evidências muito fortes de que Pedro se tornou o Pastor da igreja de Roma. E Cristo não fala nada sobre uma sucessão desta autoridade exclusivamente por Roma.

A igreja de Roma foi antigamente uma igreja bem respeitada. Recebeu um certo destaque por sua sabedoria em questões teológicas e práticas. Também foi o capital do império romano, que contribuiu uma certa preeminência. Mas Cristo nunca limitou a autoridade que ele deu aos discípulos e depois deles a cada igreja local para somente Roma. E quanto a Roma, as palavras de Cristo a igreja de Éfeso (em Ap. 2) valem também para Roma: se uma igreja local abandona a Cristo, seu candelabro é tirado.

Não, essa é uma responsabilidade dada a toda a igreja, onde quer que ela exista. Assim, Cristo diz em Mateus 18:20, imediatamente após fazer essa promessa: “onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles”. Mesmo que seja uma igreja minúscula, com apenas alguns indivíduos em algum campo missionário, a autoridade de Cristo está lá. A autoridade e a responsabilidade de julgar em nome de Cristo é dado à igreja. Onde verdadeiros cristãos estão reunidos em nome de Cristo, ali encontraremos o Espírito em ação, e ali está a igreja, com toda a autoridade de Cristo.

——

Assim, podemos ver a partir desses textos que as “chaves do reino” se referem ao poder de ligar e desligar — em outras palavras, de julgar em nome de Cristo.

Esse julgamento acontece de duas maneiras. E é isso que o catecismo quer dizer ao falar das “duas” chaves do reino: a pregação do Evangelho e a disciplina da igreja.

1. A pregação do Evangelho

Quando o Evangelho é pregado fielmente, de acordo com as Escrituras, todos devem ouvi-lo claramente: há apenas um caminho para Deus, e esse caminho é através do Salvador que Deus enviou, Jesus Cristo. Todos — você, eu e todos os seres humanos na Terra — devem se converter do pecado para Cristo. Como o apóstolo Paulo disse aos gregos pagãos em Atenas, em Atos 17:30-31:

“Ora, Deus…agora…notifica aos homens que todos, em toda parte, se arrependam; porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos.”

Na pregação, nós ouvimos esta mensagem autoritativa da parte de Cristo. O ministro da Palavra fiel é um arauto de Cristo. Então todos ouvem que a ira de Deus está contra todos nós, se não estamos em Cristo. A única esperança para você e para mim é sermos contados com Cristo. Isso significa, em primeiro lugar, nos afastarmos do pecado — reconhecendo o quanto ele é mau aos olhos de Deus — e, em seguida, entregar toda a nossa vida a Cristo, para que sejamos contados com Ele, que pagou o único preço que poderia ser pago pela nossa liberdade. Significa crer em Jesus Cristo, o Filho perfeito de Deus que se tornou nosso Salvador. Significa orar a Deus por perdão em nome de Cristo e por causa de Cristo. Significa receber batismo em seu Nome. Significa submeter-se a Cristo como o Senhor de nossa vida — ser governado por Ele, por meio de Sua palavra.

Esse Evangelho deve ser ouvido toda vez que nos reunimos. Essa pregação do Evangelho não deve deixar dúvidas na mente de ninguém que ouve: Cristo é nossa única esperança. Aqueles que não são contados com Cristo estarão perdidos. Eles perecerão sob a ira justa e retificadora de Deus. E quando eles aparecerem diante do julgamento de Deus, eles serão responsabilizados por Deus pela forma como responderam à pregação do evangelho.

Essa é a responsabilidade que Cristo deu aos seus discípulos quando lhes disse: “Eu vos dou as chaves do reino dos céus” — pregar esse Evangelho e fazê-lo ouvir alto e claro em todo o mundo.

Aqueles que se arrependem e crêem são recebidos pelo próprio Cristo em Seu reino. Aqueles que se recusam a se arrepender e crer devem ouvir e compreender que nunca terão parte nesse reino, a menos que se arrependam, e que acabarão perecendo sob a ira de Deus.

Portanto, a primeira chave do reino é simplesmente a pregação do Evangelho, pela qual o reino é aberto para alguns e fechado para outros.

2. Disciplina Eclesiástica

Mas podemos ver em Mateus 18 que “ligar e desligar” envolve mais do que simplesmente pregar o Evangelho, porque o reino de Deus não é simplesmente uma realidade invisível e espiritual. Cristo está construindo sua igreja, e você pode realmente encontrá-la e vê-la na terra, e pode ver de forma concreta quem pertence a ela e quem não pertence.

Tem pessoas que pensam que ser membro da igreja é opcional. Talvez alguns de vocês tenham amigos assim. Eu certamente conheço alguns. Eles dizem que pertencem a Cristo, mas não à alguma igreja. Às vezes dizem que a Bíblia em nenhum lugar ensina este conceito de “membresia” na igreja.

Isso é simplesmente errado. O processo de disciplina descrito aqui em Mateus 18 claramente pressupõe membresia na igreja local. Cristo usa os termos que foram usados na sinagoga — da qual os gentios e os publicanos eram excluídos.

Também nós temos as muitas exortações no Novo Testamento para se submeter aos seus líderes e obedecê-los. Por exemplo, Hebreus 13:17:

“Obedeçam aos seus líderes e submetam-se a eles, pois eles estão vigiando suas almas, como aqueles que terão que prestar contas. Deixem que eles façam isso com alegria e não com gemidos, pois isso não seria vantajoso para vocês”.

Como você pode obedecer aos seus líderes se não sabe quem eles são? Se você não é membro da sua igreja, quem são os seus líderes? Quem tem autoridade sobre você? E, por outro lado, como esses líderes devem prestar contas a Cristo, se não sabem por quem são responsáveis?

Veja o caso da disciplina que é tratado em 1 Coríntios 5. Paulo diz: “Aquele que fez isso seja removido do meio de vocês… entreguem esse homem a Satanás.” Agora, como a igreja deve fazer isso, se o homem nunca esteve entre eles?

A recusa que você encontra entre muitos cristãos hoje em dia em ser membro de uma igreja realmente se resume a uma recusa de viver sob autoridade. Esse é o problema. Não gostamos da ideia de estar sob a autoridade de outra pessoa. E de fato, não é fácil estar sob autoridade. Significa que não posso inventar as regras. Significa que não posso fazer com que as Escrituras digam o que eu quero que elas digam para justificar o que eu quero acreditar ou o que eu quero fazer. Não é fácil abrir mão disso, mas é obrigatório e também é para o meu bem. Novamente, como diz Hebreus, os oficiais ordenados estão cuidando das nossas almas.

Então, o ligar e desligar de que Cristo fala aqui em Mateus 18 não é meramente a pregação do Evangelho, mas também (na verdade, especificamente) significa a prática real e visível da disciplina.

Cristo promete honrar o julgamento da igreja, desde que esteja de acordo com as Escrituras.

O Senhor descreve como essa disciplina deve funcionar em nosso texto em Mateus 18.

  • Ela começa com uma admoestação pessoal. Se um irmão ou irmã pecar, vá e diga-lhe a sua falta.
    • Agora, no contexto Jesus está falando sobre pecado interpessoal. Ele diz: “Se teu irmão pecar contra ti, vai argui-lo entre ti e ele só”. Mas isso obviamente não limita a admoestação cristã apenas às circunstâncias em que um irmão ou irmã peca pessoalmente contra você, como se você pudesse deixar de admoestá-lo se ele pecar de alguma outra forma.
      • Hebreus 3:12–13 diz: “Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de incredulidade que vos afaste do Deus vivo; pelo contrário, exortai-vos mutuamente cada dia, durante o tempo que se chama Hoje, a fim de que nenhum de vós seja endurecido pelo engano do pecado.”
      • Ou Colossenses 3:16: “Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria.”
      • Portanto, admoestar e corrigir não se limitam aos casos em que seu irmão peca contra você. Se você ama seu irmão ou irmã, então você agirá para salvar a vida eterna deles.
    • Agora, essa etapa da admoestação pessoal é muitas vezes negligenciada no processo de disciplina.
    • Irmãos e irmãs, ouçam-me sobre isso: se vocês virem ou ouvirem falar de um membro caindo em pecado, é sua responsabilidade como membro — seu dever dado por Deus — ir e falar com esse irmão ou irmã.
      • Você não tem o direito de fofocar.
      • Você nem deve (ainda) levar o caso aos presbíteros. Isso pode acontecer logo depois, mas primeiramente você deveria cumprir sua responsabilidade de falar diretamente com seu irmão ou irmã.
      • Isso é difícil. Leva coragem. E, mais ainda, leva amor.
      • Mas você deve ir falar com essa pessoa. O próprio Cristo nos responsabiliza por isso, na medida em que vemos ou ouvimos falar de nossos irmãos vivendo em pecado.
    • Então, esse é o primeiro passo. Vá falar com eles. Se eles se arrependerem — se arrependendo de fato — então o assunto está encerrado.
      • Às vezes você escuta pessoas dizendo: “Eu era um membro de tal e tal igreja, mas saí, porque tem muita hipocrisia, ou porque não concordei com isso ou aquilo.” A pergunta ten que ser feita: “Você—como membro—buscou tratar isso?” E muitas vezes aquelas pessoas dizem “não”. “Não adianta.” “Não tenho paciência para isso.” Etc. Então a pessoa foi negligente em seu dever. Cristo nos responsabiliza—nós como membros, não somente os oficiais—a tratar o pecado dos nossos irmãos. Todos nós somos responsáveis por isso.
  • Se eles não quiserem ouvir você, ou se “se arrependerem”, mas continuarem pecando, então, diz Cristo, traga duas ou três testemunhas com você e vá falar com eles novamente.
    • Agora, pode não haver duas ou três testemunhas do pecado em si. Nem sempre tem. Mas ainda vão testemunhar a reposta do irmão ao seu tratamento.
    • Quando Cristo diz “dois ou três testemunhas”, isso não significa que não podem ser oficias. Ordinariamente deveriam ser pessoas que tem uma certa proximidade com a pessoa: amigos próximos, familiares. Pessoas que conhecem a situação, ou se não tiver, então pessoas que pelo menos conhecem bem o irmão. Se não tiver, talvez a escolha mais natural seria logo os próprios oficiais.
    • E devemos lembrar, também nesta fase, que o propósito disso é o amor — amor pelo pecador e amor pela honra de Cristo. O objetivo é restaurar e resgatar um irmão ou irmã perdido.
  • Se o irmão ou irmã não quiser ouvir as testemunhas ou se recusar a reconhecer o pecado, então Cristo nos ordena que levemos isso aos presbíteros da igreja, e os presbíteros da igreja devem visitar o irmão, fazendo toda diligência para conhecer bem os fatos, e então chamar o pecador para arrependimento. Se a pessoa se recusar a se arrepender, ela deve ser excomungada — removida da igreja e tratada como um gentio ou publicano.
    • Observam que, embora a decisão de excomunhão fica com os presbíteros—a liderança da igreja—a excomunhão é feita por toda a igreja. Cristo nem fala explicitamente sobre os oficiais da igreja, mas diz, “dize-o à igreja.” A disciplina eclesiástica é uma responsabilidade da igreja inteira, liderada pelos presbíteros. É por isso que, nas igrejas reformadas, todo o processo de disciplina é feita com transparência. A congregação é envolvida no processo, e na hora da excomunhão, não é somente os presbíteros que pronunciam o julgamento de excomunhão, mas a igreja inteira.
  • E Cristo honra esse julgamento; tudo o que a igreja vincular na terra, terá sido vinculado no céu. Aqueles que são excomungados estão perdidos. Eles estão destinados ao inferno. Eles não serão salvos, a menos que se arrependam. Cristo honra o julgamento da igreja.
  • Agora, quando Cristo diz “você deve tratá-lo como um gentio e um publicano”, isso não significa evitar a pessoa totalmente ou excluí-la da sua vida. O próprio Cristo não evitou os gentios e os publicanos. Pelo contrário, muitas vezes foi acusado de se associar demais com eles. Mas a diferencia é que ele sempre tratou os pecadores como pecadores. Ele não passou mão por cima dos seus pecados, nem fingiu que tudo estava certo na vida deles. Ele os chamou para arrependimento e salvação.
    • De fato, existem alguns textos que dizem que não devemos ter “nada a ver” com aqueles que afirmam ser irmãos na fé e, ainda assim, vivem uma vida imoral.
      • Por exemplo, 1 Coríntios 5:11: “Mas, agora, vos escrevo que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com esse tal, nem ainda comais.”
      • Mas isso trata uma situação específica, de um irmão que ainda afirma ser crente e vive hipocritamente. Acontece muitas vezes que as pessoas, até excomungadas, ainda agem como se ainda fossem membros da igreja (talvez da “igreja invisível) e querem que os outros membros afirmem isso, ou pelos menos continuem a viver com eles como se fossem ainda irmãos.
      • Neste caso, Paulo diz, não devemos ter nenhuma associação com eles, para que fique bem claro que não os consideramos como irmãos. Qualquer contato que tenhamos com eles deve deixar claro, sem nenhuma dúvida, que eles estão fora de Cristo e precisam ser salvos.
      • Então o que Paulo diz em 1 Cor 5:11 é a mesma coisa que Cristo diz: tratai-os como gentios e publicanos. Você pode ainda visitá-lo para chamá-lo a arrependimento. Se for membro de sua família, você não deve evitar todo contato, mas deve deixar claro que você está orando por ele, pela salvação dele. Nada pode ofuscar essa realidade. Não deixe que ele finja que tudo está bem.
    • Então é possível errar nisso indo nos dois extremos: por um lado, alguns cortam totalmente todo contato com a pessoa, como os Menonitas e Amish, que dizem que não podemos ter nenhum contato. Isso vai além do que Cristo diz: tratai-o como Gentio e Publicano.
    • Por outro lado, outros erram agindo como se tudo fosse normal. Fora da Ceia do Senhor, eles continuam participando em todas as atividades da igreja; ou você participa com eles em estudos bíblicos ou outros ministérios; eles se chamam de crentes e falam de “nós crentes” e você fica calado; ou (se são membros da família) dentro da família você age como se nada tivesse mudado. Isso também é errado. Eles estão sob a ira de Deus. Estão destinados a perecer no inferno para sempre, a menos que se arrependam. Não é amoroso fingir que tudo está normal. É claro que há um tempo e um lugar para essas conversas — não precisa ser o único assunto que você conversa com eles — mas eles precisam saber que estamos constantemente em oração pela salvação deles, e jamais consideramos que
      “tudo está bem”.
    • É isso que Cristo quer dizer ao considerá-los gentios e publicanos.

Deixe-me dar algumas aplicações dessas verdades antes de encerrarmos:

Primeiro, as palavras de Cristo significam que devemos levar a disciplina muito, muito a sério. Ser membro da igreja não é uma garantia de que você necessariamente será salvo (sabemos que existem hipócritas até dentro da igreja, que serão separados dela no juízo final), mas a excomunhão de acordo com a Palavra de Deus é uma garantia de que você não será salvo, a menos que se arrependa. Isto é muito sério. Não podemos de forma alguma desprezar a autoridade que Cristo deu à sua igreja. O fato que algumas igrejas infieis tem abusado esta autoridade não muda a realidade do que Cristo deu. O dia vai chegar que todos nós vamos aparecer diante de Deus, e seremos julgados, e Cristo já nos diz agora: “dei a minha igreja a autoridade para julgar, e assim que foi julgado na terra, assim também será no céu”! Naquele momento, nenhum argumento ou desculpa ou “eu não sabia” lhe fará bem algum. Cristo deixou sua posição muito clara. Rejeite a igreja de Cristo e Cristo o rejeitará.

Em segundo lugar, lembremo-nos de nossa responsabilidade pessoal de lidar com o pecado que vemos. Sejamos honestos, irmãos e irmãs. Às vezes as igrejas reformadas ganharam uma reputação por embriaguez e licenciosidade (essa é uma palavra bíblica que significa viver como se você tivesse licença para fazer o que quiser). Podemos discutir se esta reputação é merecida ou não. Mas não é incomum.

Às vezes é a culpa dos presbíteros, porque foram covardes e não quiseram lidar com o pecado que eles também observaram na igreja. Mas às vezes também é porque os membros não fizeram sua parte. Os presbíteros não observam tudo. Por exemplo, os presbíteros nem sempre ficam ciente do que acontece entre os jovens, ou entre os grupos de mulheres. A responsabilidade de admoestação mútua é dada a toda a igreja e todos os membros. E às vezes não acontece porque os membros que sabem o que está acontecendo simplesmente não amam seus irmãos e irmãs o suficiente — nem a honra de Cristo o suficiente — para ir falar com eles sobre o pecado deles e iniciar o processo que Cristo nos dá aqui em Mateus 18. Se você sabe que seu irmão ou irmã está vivendo em pecado, você deve ir falar com eles, e cada um de nós terá que prestar contas a Cristo por isso. Então vá falar com eles. Se eles não se arrependerem, traga testemunhas. E se eles ainda assim não se arrependerem, leve o caso aos presbíteros! Que vergonha para nós se estivermos dispostos a deixar o nome de Cristo ser arrastado pela lama por causa da libertinagem que existe entre nós.

E entenda bem, a disciplina da igreja não é apenas para os membros comungantes que vão à Mesa do Senhor. Todos nós—também os jovens que ainda não fizeram profissão de fé—são membros com todos os deveres e responsabilidades de membros. E também são sujeitos, como qualquer outro, à disciplina da igreja.

Poucas coisas trazem desonra ao nome de Cristo como igrejas que permitem que a hipocrisia e o mundanismo continuem sem controle; cujos jovens — e muitos não tão jovens — ficam bêbados nos fins de semana ou agem como ímpios; ou quando membros vivem brigados entre eles, sem querer tratar; ou quando o pecado é conhecido e não tratado.

É por isso também que certos pecados públicos exigem a suspensão imediata da Ceia do Senhor. Mesmo que haja sinais de arrependimento, se o pecado for de natureza pública — por exemplo, se estiver no jornal, se a polícia estiver envolvida ou se acontecer em um contexto público — as igrejas reformadas sempre tiveram uma política de suspensão imediata da Ceia do Senhor e—se o pecador se arrepender—também uma confissão pública. O objetivo disso é que o nome de Cristo não seja desonrado por nossa causa — para que todos, dentro e fora da igreja, possam ver que o pecado está sendo levado a sério pela igreja.

Em tudo isso, é importante lembrar o propósito da disciplina. A principal razão é para que o irmão ou irmã se arrependa. Portanto, é por amor ao irmão ou irmã. Mas também é para evitar que o pecado de uma pessoa corrompa toda a igreja. Pecado não tratado se espalha. É por isso que, quando Paulo disse aos coríntios para excomungarem o homem que estava dormindo com sua madrasta em 1 Coríntios 5, ele os advertiu: “Não sabeis que um pouco de fermento leveda toda a massa?”

E, finalmente, temos a responsabilidade de exercer disciplina por amor do nome de Cristo. Que nunca aconteça o que Isaías declarou ao povo de Israel: “O nome de Deus é blasfemado o dia inteiro por causa de vocês”.

Portanto, irmãos e irmãs, recebamos as palavras de Cristo aqui com espírito sóbrio. Vocês, presbíteros e pastores, usem as chaves do reino como Cristo lhes ordenou, pelo bem do Seu nome digno. E vocês, irmãos e irmãs, recebam a admoestação deles se eles os corrigirem; humilhem-se diante deles; reconheçam a grande e pesada tarefa que eles têm de vigiar suas almas, e concedam que isso seja uma alegria e não um fardo para eles. E que cada um de nós faça a sua parte, conforme Deus nos dá essa responsabilidade de acordo com as circunstâncias em que nos coloca, para admoestar uns aos outros, corrigir uns aos outros e também ouvir as admoestações uns dos outros. É para o nosso bem e nossa salvação que Deus nos colocou juntos. Tenhamos em alta estima o nome que Ele nos deu — o nome cristão — e protejamos a Sua honra e reputação.

Amém!

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Jonathan Chase

Jonathan Chase

O pastor John Chase é Missionário de Aldergrove Canadian Reformed Church nas Igrejas Reformadas do Brasil. B.A., Western Washington University, 2012; M.Div., Canadian Reformed Theological Seminary, 2016. Serviu anteriormente como pastor da Igreja Reformada de Elora em Ontario, Canadá nos anos 2016-2020. 

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* Este sermão foi originalmente escrito para uso do pastor e não passou por correção ortográfica ou gramatical.