Leitura: 2 Pedro 01.15-19
Texto: Mateus 17.01-13
Amada igreja do Senhor,
Na época em que o evangelho foi escrito, muitos questionamentos eram feitos acerca de Jesus como sendo o messias. Pois o povo judeu esperava a chegada desse ungido na expectativa de que ele o libertaria da opressão e julgo das grandes nações da época. Então, quando Jesus começou o seu ministério, o povo esperava ver um grande rei que o livraria das mãos do grande império romano.
Até mesmo os discípulos de Jesus pareciam acreditar em algo que se manifestaria num triunfo político que traria grande mudança na vida social e política do povo. Podemos ver em Lc. 19: 11 que os discípulos, após ouvirem que o Filho do homem veio para salvar e buscar o perdido, acharam que isso aconteceria logo. Muitos poderiam estar se perguntando: “Se Jesus é o messias, por que ele não estabeleceu logo o seu reino?”, ou “Onde está a sua glória, o seu poder, o seu exército?”.
Por isso, o evangelho de Mateus foi escrito com o objetivo de apresentar aos judeus a Jesus como de fato esse messias, prometido no Antigo Testamento, que viria para estabelecer o seu reino. Ele mostra Jesus como o rei, o verdadeiro Rei dos judeus, pois foi desta forma que Jesus foi procurado pelos magos do Oriente: “Onde está o recém-nascido Rei dos judeus?” (Mt. 2:2).
Nele, Cristo aparece pregando o evangelho do reino (4:23), mas não de um reino como o mundo estava acostumado a ver. Era o reino dos céus, o reino dos humildes de espírito (5:3) e dos perseguidos por causa da justiça (5:10). E assim, Jesus envia seus discípulos para pregarem o evangelho do reino dos céus (Mt. 10:23).
Mas, no capítulo 16:21, Jesus prediz seu sofrimento e sua morte. Isso soou como uma contradição, e a reação, de Pedro, foi rápida. A questão é: como pode o messias, o Cristo, o Filho de Deus, caminhar para o sofrimento e a morte? O Filho do homem não veio para salvar? Como poderia caminhar para a morte? Essa notícia surgiu como uma contradição ao que tinha sido dito anteriormente neste mesmo capítulo: “Sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” (16:18).
Mas, Jesus, para mostrar que isso não é uma contradição, termina o capítulo com uma palavra de esperança: “Em verdade vos digo que alguns há, dos que aqui se encontram, que de maneira nenhuma passarão pela morte até que vejam vir o Filho do Homem no seu reino.” A morte não é o final, mas um meio para chegar a um fim, a glória do Filho do homem.
Dessa forma, a transfiguração de Jesus é uma mensagem de fortalecimento para a igreja. Os discípulos, neste momento de anúncio da morte do filho do Homem, não poderiam se enfraquecer, mas continuar, pois a morte de Jesus redundaria em glória. Por isso, o tema de nossa mensagem é: Após o anúncio da sua morte, Cristo revela a sua glória para o fortalecimento da sua igreja. Veremos três pontos:
- A glória antecipada
- A glória confirmada
- A glória iniciada
- A glória antecipada
O texto começa mostrando uma ligação entre o que estava sendo dito e o que vai ser dito: “seis dias depois”. Isso mostra que o acontecimento da transfiguração está ligado ao tema do anúncio da morte e do sofrimento de Jesus. Então, o caminho para o sofrimento ainda é o foco. Mas, neste caminho, o senhor Jesus quer revelar algo surpreendente.
Ele toma em particular três discípulos: Pedro, Tiago e João e os leva para um alto monte com o fim de revelar-lhes algo (v. 1). E subitamente, foi transfigurado (v.2). O verbo usado descreve uma mudança, e, conforme o relato, uma mudança física, não interna, mas externa, ou seja, na forma. Jesus não deixou de ser Jesus, mas adquiriu uma forma externa que não era a sua, porque ela foi transformada. E ele foi transformado de tal forma que “o seu rosto resplandecia como o sol, e as suas vestes tornaram-se brancas como a luz.”
Neste momento, Cristo revela aqui que tinha dito no final do capítulo 16: “Até que vejam vir o Filho do homem no seu reino”. A glória do Filho do homem foi revelada antes mesmo da sua morte. O rei Jesus mostrou o seu reino para os seus três discípulos para mostrar que ele não era um rei derrotado, mas o rei que virá com seu exército e reinará sobre todos.
A sua glória será incomparável. A glória revelada aqui é aquela presenciada por João na ilha de Patmos, a do Cristo glorificado, que disse: “Estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos” (Ap. 1:18). João descreve o que viu como “um semelhante a filho de homem” (1:13), e “O seu rosto brilhava como o sol na sua força” (1:16). Foi o Cristo exaltado que os discípulos viram. O brilho como o do sol e a brancura como a da luz são sinais de sua glória celestial.
Na transfiguração, Cristo revelou sua sobreexcelente glória, superior à glória desvanecente do rosto de Moisés (2 Co. 3:7,10,11). Esta transformação trouxe a certeza para os discípulos de que aquele corpo humilhado se revestiria de glória eterna. Portanto, a mensagem dessa glória antecipada é de exaltação do Filho do homem. Sua recompensa já estava reservada, e a humilhação tinha os seus dias contados.
Com essa glória revelada em meio ao estado de humilhação, Cristo fortaleceu os seus discípulos para continuassem seu trabalho, e fortaleceu a fé dos discípulos nas palavras confessadas em Mt. 16:16: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.” Eles poderiam continuar vencendo as portas do inferno, mesmo que parecesse que o final estivesse chegando com a morte de seu Senhor. Eles continuariam a vida com imagem da glória de Cristo na transfiguração, pois sabiam que, um dia, aquele Jesus, o Filho do homem, se revelaria em glória.
Outro ponto é que a aparição de Cristo na sua glória, como o Filho do homem glorificado, foi uma garantia de que ele cumpriria a sua palavra dita no verso 25 do capítulo 16 de que quem perder a vida por sua causa a acharia. Os discípulos não estavam servindo a um mestre fraco e debilitado, nem os servos estavam servindo a um rei impotente, mas ao rei da glória. Por isso, contemplar a glória de Cristo, neste momento, no anúncio da sua glória, era contemplar a recompensar por perder a sua vida por ele.
Mas, e nós? Nós não estamos no monte da transfiguração. Não podemos contemplar a imagem que Pedro, Tiago e João contemplaram. Porém, nós que estamos em Cristo contemplamos a glória pela fé. Apesar das perseguições, da cruz que carregamos diariamente servindo ao nosso salvador, apesar de, às vezes, parecer que estamos trilhando um caminho de derrota, e de nos sentirmos fracassados (pode ser que os que estão sendo perseguidos neste momento estejam assim), a revelação da glória de Cristo nos dá esperança de uma glória futura.
Assim, podemos dizer, com toda certeza, “Pela fé, eu vejo o meu rei, o Filho do homem no seu reino. Eu vejo a sua glória, porque Deus resplandece em nossos corações a luz que nos faz contemplar a glória do rosto de Cristo” (2 Co 4:6).A glória superior
- A glória superior
Diz o texto que “Lhes apareceram Moisés e Elias, falando com ele.” (v.3) E um ponto que precisa ser destacado aqui é que eles apareceram falando com ele. Isso nos leva a fazer uma conexão entre esses dois homens e Cristo. Cristo mesmo fez isso, em Lc. 24:27, quando expunha aos discípulos o que a seu respeito constava em todas as Escrituras. E diz o texto que ele começou por Moisés e discorreu por todos os profetas.
Moisés e Elias aqui conversando com Cristo são as antigas testemunhas de Cristo; Moisés, a lei, e Elias, os profetas. Eles falam a respeito de Cristo nas Escrituras e apontam para a sua obra. A sua conversa neste momento da transfiguração transmite-nos essa mensagem. Foi uma mensagem de testemunho e confirmação de que este Jesus era de fato o messias prometido nas profecias do Antigo Testamento.
Agora, não é mais Cristo que está em Moisés e nos profetas, mas Moisés e os profetas é que estão em Cristo. A glória de Cristo no monte, agora, é superior aos dois grandes representantes aqui da Escritura do Antigo Testamento. Isso expressa a unidade entre a lei e o evangelho, entre a profecia e o seu cumprimento.
Elas apontam também para um período de transição. Apontam para Cristo. Ambos estiveram no monte santo com Deus. Elias esteve no monte quando fugia de Jezabel. Lá Deus falou com ele (1 Rs 19:8-9). Moisés, em Êx. 24:15-16, subiu ao monte, e lá, no alto, uma nuvem cobriu o monte. E a glória do Senhor pousou sobre o monte Sinai, e a nuvem o cobriu por seis dias.
Em outro momento, como narrado em Êx. 34:29-30, depois de ter falado com Deus e recebido as duas tábuas da lei novamente, desceu do monte, e diz o texto que “Não sabia Moisés que a pele do seu rosto resplandecia, depois de haver Deus falado com ele. Por causa disso, sabemos da importância desses homens para os judeus. Daí pode se explicar a sugestão de Pedro no verso 4 de fazer três tendas para os três, como se fosse bom que Moisés, Elias e Cristo permanecessem juntos.
Mas, neste momento, que recebe a glória é Cristo e somente ele, pois quem estava sendo exaltado na transfiguração era Cristo. E eles estavam ali para anunciar isso. Esses homens, agora, não estavam ali mais para falar com Deus e receber dele revelação, mas para falar com Cristo e a ele servir.
Por isso, vemos no verso 5 como que uma resposta de Deus à sugestão de Pedro. “Uma nuvem luminosa os envolveu; e eis, vindo da nuvem, uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo: a ele ouvi.” No Sinai, quando Moisés estava lá para falar com Deus, uma nuvem desceu e o encobriu, e Deus o chamou (Êx. 24:15-16). Neste monte da transfiguração, Deus chama o seu Filho da nuvem de meu Filho amado. É a voz de Deus, não chamando Moisés, mas declarado o seu amor incomparável pelo filho. Por isso, a voz completa: a ele ouvi.
Aqui está o centro da narrativa, quando o Filho de Deus recebe do Pai a confirmação de que ele é o filho amado, o enviado de Deus. A sua glória apareceu como glória superior testemunhada pelo próprio Pai. E vejam que as palavras do Pai, neste momento, não foram endereçadas a Jesus, como o foi no seu batismo (Mt. 3:17), mas aos discípulos. Pois eles deveriam dar ouvidos a ele, que era o centro de toda a revelação.
Aqui temos uma confirmação de Deus de que Jesus o servo sofredor profetizado anteriormente. Essas palavras também foram profetizadas em Is. 42:1: “Eis aqui o meu servo, a quem sustenho; o meu escolhido, em quem a minha alma se compraz; pus sobre ele o meu Espírito, e ele promulgará o direito para os gentios.” O Servo sofredor que obteve do Pai a sua glória, pois nele confiou e se firmou. Ele, de pé, diante dos discípulos e de Moisés e Elias, foi exaltado por Deus. Grande é a sua glória. Pois, como profetizou Isaías, “Eis que o meu Servo procederá com prudência; será exaltado e elevado, e será mui sublime.” (Is. 52:13).
Não há como não temer. Por isso, os discípulos temeram, foram tomados de grande pavor, porque viram a glória do Filho do homem testemunhada pela voz do próprio Pai.
Jesus se aproxima e os toca, como fez com aqueles doentes que desfrutaram da sua misericórdia, e os levanta com as palavras de consolo: “Erguei-vos e não temais” (v.7). E estava lá, não mais com Moisés nem com Elias, mas sozinho, porque tudo apontava para ele: a lei, os profetas e o próprio Pai.
É com essa visão, testemunhada por ele no monte da transfiguração, que o apóstolo Pedro encoraja a igreja a confirmar a sua vocação e eleição, testificando que ele “recebeu, da parte de Deus Pai, honra e glória, quando pela Glória Excelsa lhe foi enviada a seguinte voz: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo. Ora, esta voz nós a ouvimos quando estávamos com ele no monte santo.” (2 Pe. 1:16-18). Uma testemunha ocular, testificando da glória de Cristo.
- A glória iniciada
Em Daniel 7:13-14, o Filho do homem é descrito como vindo com as nuvens do céu. E diz o texto que “Foi-lhe dado domínio e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas as línguas o servissem; o seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído.” Este é Jesus Cristo! Que revelou a sua glória e da nuvem recebeu o testemunho de Deus acerca da sua missão.
Mas essa glória só chegaria por meio do sofrimento: “Era necessário seguir para Jerusalém e sofrer… ser morto, e ressuscitado no terceiro dia.” (Mt. 16:21). O início dessa glória do Filho do homem é o sofrimento, a cruz. Humanamente falando, sofrer e morrer é um sinal de derrota. Porém, a cruz não era um sinônimo de derrota, não era o final, mas era o caminho para a vitória.
O Senhor Jesus dá uma ordem: “A ninguém conteis a visão até que o Filho do homem ressuscite dentre os mortos” (v.9). O foco ainda é a cruz. O caminho para a glória já começou no sofrimento do Filho de Deus, pois Jesus veio para entregar a sua vida primeiro para depois receber a sua recompensa.
Na época, havia expectativas populares de Elias ainda iria voltar ao povo para trazer restauração, ou seja, arrependimento e renovo. Os judeus acreditavam nisso, como o próprio Pedro descreve no verso 10, baseados na profecia de Ml. 4:5, que antecipa a vinda de Elias em relação ao dia do Senhor.
Por causa disso, os discípulos interrogaram a Jesus acerca da profecia, porque eles já estavam vendo o filho do Homem e só agora viram Elias. Eles ficaram confusos. Mas Cristo confirma a vinda de Elias e a sua obra de restauração (v.11). Só que a vinda de Elias já havia acontecido e o seu ministério já havia sido realizado, porque João Batista era Elias, e isso já havia sido afirmado por Jesus antes (Mt. 11:14). Ele veio, sofreu, e foi ultrajado pelos homens. O seu ministério havia sido cumprido.
Jesus usa o ministério de João Batista para mostrar que o seu ministério já havia começado e que iria trilhar o mesmo caminho do seu antecessor. Esse é o ponto chave desses últimos versículos: identificação do ministério de Elias no ministério de João Batista. Pois se os discípulos entendessem o ministério de João Batista, como demonstraram que entenderam (v. 13), eles entenderiam o ministério do Filho do homem, que a sua glória viria com o seu sofrimento e morte. Se Elias era João, então Cristo era o Filho do homem, o messias, que trouxe o seu reino.
Sem o sofrimento e a morte, não haveria a glória e o poder de salvar o seu povo. Este é o ponto de partida, a garantia da vitória. Esta é a mensagem da glória de Cristo para a sua igreja. Ela começa com o sofrimento. A igreja caminha para a glória do último dia, revelada por Jesus, o Filho do homem, mas passando pela via dolorosa da cruz. Cristo mesmo disse: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me. Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á.” (Mt. 16:24-25).
Amém.
Iraldo Luna
É formado em Letras Vernáculas pela UFPE com pesquisas voltadas para a área de linguística de texto. Bacharel em Divindade pelo Instituto João Calvino. É pastor na Igreja Reformada de Brasília. Professor do curso on-line de introdução ao Grego Bíblico no Instituto João Calvino.
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* Este sermão foi originalmente escrito para uso do pastor e não passou por correção ortográfica ou gramatical.