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Resumo
No segundo ponto, falando sobre o valor teológico das Institutas, eu destaquei que a teologia das Institutas:
- É fundamentada nas Escrituras;
- Tem uma estruturação antitética;
- Não é especulativa;
- Ilustra o princípio da acomodação;
- É apresentada de forma retórica.
Na primeira aula, tocamos algumas vezes na questão da relação das Institutas com as Escrituras. Nesta segunda aula vamos ampliar este assunto.
Mas antes, veremos algo sobre o título da obra. O título pode nos ajudar a compreender os objetivos de Calvino, e compreendê-los pode nos ajudar a compreender sua obra.
Portanto a segunda aula terá dois pontos:
- O título da obra;
- As Institutas e as Escrituras.
O Título da Obra
Uma das recomendações de Mortimer Adler em sua obra Como Ler Livros é de que antes de realizar a leitura analítica de uma obra, se faça a leitura inspecional.
A leitura inspecional, envolve entre outras coisas observar o título e o sub-título da obra. Isso nos dá uma ideia dos objetivos do autor. E saber os objetivos do autor, nos ajuda a compreender o conteúdo do livro.
A primeira edição das Institutas foi publicada em março de 1536, com as seguintes informações (ver destaques: Basel, por Thomas Platter e Balthasar Lasius):
Christianae Religionis Institutio, totam fere pietatis summam, et quidquid est in doctrina salutis cognitu necessarium complectens; omnibus pietatis studiosis lectu dignissimum opus, ac recens editum. Joanne Calvino Nouiodunensi autore. Basileae MDXXXVI, Colophon: Basileae per Thomam Platteru & Balthasarem Lasium, mense Martio, ano 1536. 8 vo, pp. 541.
As demais edições latinas traziam por título Instituito Christianae Religionis.
Como podemos observar esse título está no singular, mas as traduções geralmente tem utilizado o plural – “Institutas da Religião Cristã”.
O que significa o termo latino “Institutio”? Este termo pode ser traduzido como “Instituto”, mas em nossa língua este termo é muito abrangente, podendo se referir a uma escola, ou outro tipo de entidade, e até a um instituto de beleza.
Os estudiosos geralmente tem identificado a palavra com o significado de “instrução”.
Como tal foi usado por um dos Pais da Igreja, chamado Lactâncio. Ele escreveu uma obra chamada “Instituições Divinas” (De Divinis Institutionibus).
A palavra latina institutio, às vezes na forma plural instituições, era usada com frequência em títulos do século XVI, com o significado de “instrução” ou “educação”.
O Dr. David Calhoun, apresenta o termo a partir deste significado. Segundo ele, poderíamos traduzir o nome latino “Institutio Christianae Religiones”, por “Manual de Instrução na Religião Cristã”, ou simplesmente “Instrução Básica na Fé Cristã”.
No entanto, Alister E. McGrath, abre o leque de possibilidades em relação ao título. Segundo ele, com o termo “Instituição”, talvez Calvino desejasse “… retornar a uma forma mais autêntica de cristianismo do que a encontrada no final do período medieval”. Daí, ele conclui: “Calvino se interessava pelo cristianismo como instituído originalmente, não como foi desenvolvido (ou deformado, na opinião de Calvino) na Idade Média.”
Creio que aqui é útil observar que o título descritivo da primeira edição (1536):
“Instituição da Religião Cristã, resumo quase completo da piedade, abrangendo tudo o que, quanto à doutrina da salvação, é necessário conhecer; obra seleta e à altura de todos os estudiosos da vida piedosa, recentemente publicada. Prefácio dedicado ao cristianíssimo rei da França, a quem este livro é oferecido no interesse de uma confissão de fé.”
Com base nessas palavras de Calvino, o Dr. Jacques Pannier ressalta: “O título do livro diz bem qual é o seu objetivo”.
E aqui, podemos concluir que o objetivo, nos ajuda a entender o significado de “Institutio”. É o próprio Calvino quem em seu prefácio à edição francesa de 1541, se refere às Institutas como “um sumário da doutrina cristã”, e de “suma da religião” no prefácio da edição de 1559.
Portanto, podemos concluir, que apesar da obra de João Calvino ser um chamado de retorno ao cristianismo tal como ele foi instituído, o nome “Institutas da Religião Cristã”, simplesmente quer dizer: “Instrução na Religião Cristã”.
As Institutas e as Escrituras
A primeira coisa para a qual quero chamar sua atenção é para o fato de que Calvino estava ciente de seu chamado singular para servir como doutor na igreja de Cristo.
Logo após sua conversão (1533/1534), ele foi procurado por pessoas que buscavam por instrução na doutrina pura. Isso o forçou a estudar ainda mais as Escrituras.
Estudando as Escritura, Calvino aprofundou-se no conhecimento da verdade e da piedade. E diante da necessidade dos fieis na França, ele escreveu então sua grande obra, as Institutas da Religião Cristã. Seu desejo era explicar os principais tópicos das Escrituras.
Por isso, essa primeira edição, como veremos na próxima aula, tinha a estrutura de um catecismo com explicações sobre o Credo Apostólico, os Dez Mandamentos, a Oração do Senhor, os sacramentos, os falsos sacramentos e a liberdade cristã.
Mas como salienta o Dr. David Hall, após elaborar o Catecismo de Genebra em 1537, Calvino a partir da segunda edição das Institutas (1539), dirigi-se mais aos estudantes de teologia que se preparavam para o ministério, do que aos demais leitores.
Ao que parece a experiência de Calvino como escritor, professor e pastor fizeram que ele seguisse um certo plano no desejo de cumprir sua vocação singular. Desde a primeira edição das Institutas (1536), até à última edição em latim (1559) podemos ver que ele cresceu como homem, escritor, teólogo, e pastor. Isso fica evidente em seus escritos e biografia.
“Pois a Escritura é a escola do Espírito Santo, na qual não se deixa de pôr coisa alguma necessária e útil de se conhecer, nem tampouco se ensina nada mais além do que se precisa saber.”
João Calvino, Institutas Livro III, Capítulo XXI, Seção 3 [EC]
Além das Institutas e de diversos outros tratados teológicos, Calvino escreveu um dos maiores comentários bíblicos escritos por um único homem. Os comentários bíblicos de Calvino reúnem quarenta e cinco volumes com mais de quatrocentas páginas cada. Isso sem contar seus sermões.
Então temos o comentários, as aulas para os candidatos ao ministério da Palavra, e as pregações. Ele pregava o Novo Testamento duas vezes aos domingos (às vezes nos Salmos), pela manhã e à tarde , e pregava todos os dias da semana pela manhã em quinzenas alternadas. Estima-se que Calvino pregou cerca de 4000 sermões. Dos quais foram preservados apenas 1500.
“A melhor maneira de imaginar as Institutas é como uma série de tópicos extraídos do trabalho de Calvino na interpretação da Bíblia. O fluxo sempre foi das escrituras para o livro.”
Bruce Gordon
“As Institutas pertenciam a um corpo maior de escritos que incluía os volumosos comentários bíblicos de Calvino, onde, pode-se argumentar, que seu coração realmente estava. As institutas e comentários deveriam ser lidos lado a lado. Ambos forneceram interpretação da Palavra de Deus, de maneiras diferentes, mas complementares. Os comentários seguiram o grão do texto bíblico e explicaram o significado das palavras, enquanto as Institutas ofereceram instruções na doutrina encontrada nas Escrituras. A carta de Calvino ao leitor nos lembra seu desejo irresistível de interpretar a Palavra de Deus. Ele tinha um relacionamento íntimo com um livro, mas esse livro era a Bíblia.”
Bruce Gordon
Assim, aprendemos que o objetivo das Institutas, era servir principalmente como uma introdução teológica aos seus comentários bíblicos para que ele não tivesse que lidar com questões teológicas fora de contexto.
“Calvino é primeiro um teólogo das Escrituras e um usuário de filosofia, lógica, retórica e todas as ferramentas humanas de organização apenas em segundo“.
Ford Battles
Eis uma prova: conforme o Dr. David Calhoun, podemos encontrar quase 7.000 referências bíblicas nas quais se destacam duas coisas:
Em primeiro lugar, devemos notar a relevância das referências bíblicas usadas por Calvino nas Institutas.
Ou seja, Calvino não faz como alguns autores que lançam uma multidão de referências bíblicas para provar suas posições. Referências que as vezes não tem relação real com o tema abordado.
Um exemplo disso, pode ser visto na carta enviada ao rei Francisco I. Ao tratar das acusações lançadas pelos romanistas contra a fé reformada, Calvino fala da alegação romanista de “que a forma da igreja seja sempre aparente e esplendorosa” e que a “igreja seja sempre mostrada com o dedo”.
Calvino responde a isso, chamando atenção para 1 Rs 19.14,18 . Com esses textos Calvino mostra claramente que no tempo do profeta Elias, a Igreja não era aparente e esplendorosa e tão pouco podia ser apontada com o dedo.
Outro exemplo, na mesma carta ao rei Francisco I. Os romanistas diziam que a pregação reformada estava promovendo tumultos e contendas. Calvino menciona 1 Rs 18.17-18, para mostrar que esta também foi a acusação que Acabe fez ao profeta Elias:
Por isso, o editor das versões em inglês, John T. McNeil, diz em sua introdução que “a prontidão de Calvino em aplicar passagens das Escrituras sobre cada ponto de argumento é surpreendente e talvez nunca tenha sido superada”.
Em segundo lugar, devemos notar a boa exegese de Calvino, em seu uso das Escrituras nas Institutas.
Ele geralmente faz uso das referências bíblicas com base em uma exegese bem-feita.
“Calvino foi o melhor exegeta na história do cristianismo. Isso não significa dizer que ele estava sempre certo em sua interpretação, ou que a igreja não tenha exegetas que o tenham superado em uma variedade de áreas nos últimos 500 anos, mas quem entre os grandes teólogos pode concorrer com ele em abrangência, exatidão e concisão na interpretação bíblica? Nem Agostinho. Nem Aquino. Nem Lutero. Nem Owen. Nem Edwards. Nem Barth. Apenas Warfield corresponde à sua confiabilidade (mas não à abrangência de sua exposição, nem sua brevidade). Quem entre os grande pregou e comentou tão bem e em tão grande parte da Bíblia quanto Calvino? Ninguém.”
Lingon Duncan
Um exemplo dessa capacidade, podemos encontrar no Livro I, Capítulo XII, Seção 3, onde Calvino expõe o erro dos romanistas no que diz respeito a tentativa de diferenciar dulia de latria. Quanto a isso diziam: latria se refere ao culto que só pode ser prestado a Deus, mas dulia pode ser prestada aos santos.
Calvino responde com Gálatas 4.8.
“Postas de parte as sutilezas, examinemos a coisa em si. Paulo, quando traz à lembrança aos gálatas o que foram eles antes de haver sido iluminados no conhecimento de Deus, diz que haviam exibido dulia para com aqueles que por natureza não eram deuses [Gl 4.8]. Portanto, uma vez que não a denomina de latria, porventura a superstição lhes seria escusável? Certamente não a condena menos por chamá-la dulia do que se a denominasse de latria.”
João Calvino
Mas de onde vem essa capacidade exegética? Os estudiosos costumam concorda que pela Providência de Deus, que o fato de Calvino ter estudado direito em duas universidades na França contribuiu para aprendesse a abordar um texto diretamente, interpretá-lo dentro dos parâmetros lingüísticos e históricos de seu contexto e aplicá-lo. Além disso, sabemos que ele estudou hebraico e grego e dedicou muito tempo ao estudo das Escrituras.
É claro que Calvino não é infalível em sua exegese (também veremos alguns exemplos no decorrer de nossa leitura). Mas geralmente suas citações estão baseadas em boa exegese o que certamente tem relação com seus comentários das Escrituras.
“Calvino desejava fornecer essencialmente um comentário doutrinário das Escrituras, permitindo que o leitor da Escritura tenha acesso direto ao seu significado autêntico.”
Alister McGrath
Portanto, o objetivo de Calvino era de que as Institutas se tornassem um guia à Escritura.
“Embora a Santa Escritura contenha uma doutrina perfeita, a qual nada se pode acrescentar, porque aprouve a nosso Senhor nela revelar os infinitos tesouros de sua sabedoria, entretanto a pessoa que não for bastante experimentada em seu manuseio e entendimento necessita de certa orientação e ajuda, para saber o que deva nela buscar a fim de não vaguear incerta, antes alcance rota segura que lhe faculte atingir o fim a que a convoca o Santo Espírito.”
João Calvino em seu prefácio à edição francesa de 1541
Por isso, em sua mensagem ao leitor (1559), no início das Institutas, Calvino escreve sobre seu propósito:
“… foi este meu propósito: preparar e instruir os candidatos ao aprendizado da palavra divina da sagrada Teologia, para que possam ter um acesso fácil a ela, assim como prosseguir livremente em seus passos, pois que considero ter reunido uma tal suma da religião em todas as suas partes e a tenha classificado em tal ordem, que qualquer um que a considere retamente não terá dificuldade em estabelecer e buscar o que é principal na Escritura, e possa aquele, ao final, referir tudo que nela está contido.”
Portanto, aquele que se dispõe a estudar as Institutas, seja um candidato ao ministério ou não, deve ter como objetivo final o estudo da própria Escritura. Neste caso, as Institutas são um meio para alcançar este objetivo maior. Ela é uma suma da religião, religião que é revelada nas Escrituras. Nas Institutas podemos aprender o que é principal nas Escrituras.
Ao ouvirmos sobre a relação entre as Institutas e as Escrituras, devemos nos perguntar com sinceridade: Meu desejo ao estudar as Institutas é conhecer mais da Palavra de Deus a fim de ser levado à adoração e ao viver piedoso que resulta na glória de Deus?
Se você possui o desejo sincero de crescer no conhecimento de Deus e nos seus frutos, permita-me oferecer algumas instruções que podem ser úteis à medida em que avançarmos através das Institutas (isso vale para todo estudo teológico):
- Comece sua leitura e estudos com oração. Mesmo que seja uma oração pequena, o importante é que seu coração se dobre antes de ler e estudar sobre Deus. Faça de seu estudo teológico um momento de devoção a Deus;
- Leia as Institutas com a Bíblia aberta. Com isso quero dizer, não só para conferir as referências, mas conferir o que Calvino diz nas Institutas com o que dizem as Escrituras;
- Lembre-se as Institutas são um meio, não um fim em si mesmas. Use o meio, enquanto persegue o fim;
- Leia com gratidão a Deus, pela vida e pelo trabalho de João Calvino, bem como pelas editoras e tradutores de suas obras;
- Se possível leia os comentários de Calvino.
Conclusão
O título da obra
- “Institutas da Religião Cristã”;
- “Instrução na Religião Cristã”.
As Institutas e as Escrituras.
- Calvino desejava comentar toda a Escritura;
- O objetivo das Institutas, era servir principalmente como uma introdução teológica aos seus comentários bíblicos para que ele não tivesse que lidar com questões teológicas fora de contexto;
- Nas referências bíblicas que encontramos nas Institutas se destacam duas coisas:
- Em primeiro lugar, sua relevância;
- Em segundo lugar, sua precisão exegética.
Questionário
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Bibliografia
CALVINO, João. As Institutas: Edição Clássica. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.
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CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.
CALVINO, João. Institutas da Religião Cristã. São José dos Campos: Editora Fiel, 2018.
ADLER, Mortimer J.; VAN DOREN, Charles. Como Ler Livros: O Guia Clássico para a Leitura Inteligente. São Paulo: É Realizações, 2010.
CALHOUN, David. Introducing the Institutes [aulas].
MCGRATH, Alister E.. O Pensamento da Reforma. São Paulo: Cultura Cristã, 2014.
HALL, David. A Theological Guide to Calvin’s Institutes: Essays and Analysis (Calvin 500). Phillipsburg: P&R Publishing, 2015.
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BEEKE, Joel (Org.). Calvino para Hoje – Uma contínua influência sobre a igreja e sobre a sociedade. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.
Material para Download
Ementa
- Razões para a leitura das Institutas;
- O título da obra e sua relação com as Escrituras;
- Edições e traduções das Institutas;
- A estrutura das Institutas e instruções para sua leitura.
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